Nesses tempos de tantos desvios dos princípios do uso do poder que tornam a política desacreditada, polarização tóxica, decadência da qualidade do debate público e político, ataques pessoais e obsessão ao poder na defesa de interesses pessoais, pode ser inspirador resgatar histórias que contradizem os prazeres do ego e trazem lições valiosas para elevar nossa nação a um novo patamar civilizatório. São exemplos de que uma vida de propósito, como deveria ser a de todos que adentram na atividade pública, é uma vida de serviço, amor e entrega.
Suzano, que completa seus 76 anos de emancipação político-administrativa neste dia 2 de abril, traz várias referências de que o poder, em vez de usado para manter estruturas políticas e governamentais à base do medo, da exploração e do controle, esteve a serviço de um legado humanitário. São histórias que mostram o amor como força motriz para mover relações de interesse público. Resgatar e preservar essas memórias são de fundamental importância para salvar nossa história recente sem comprometer o futuro.
A restauração da capela de Nossa Senhora da Piedade, onde fica a igreja do Baruel, é sem dúvidas uma das mais emblemáticas. Fruto do amor genuíno de Roberto Bianchi por sua esposa, Ernestina Maria de Jesus, o local é considerado o maior patrimônio histórico e cultural da cidade. Nele está o “marco zero” de Suzano, que foi reconstruído em 1916 por iniciativa de Bianchi, depois que uma tempestade desabou grande parte da capela de Nossa Senhora da Piedade.
A inauguração e restauração da capela foram uma prova de amor a Ernestina, religiosa fervorosa e devota de Nossa Senhora da Piedade. Além da reconstrução da igreja, Bianchi também mandou reformar em Mogi a imagem partida da santa, em homenagem à esposa. Imigrante italiano, Roberto Bianchi era um homem de família, que sempre foi sua prioridade. Humilde, gostava de ajudar os mais necessitados e tinha um forte apreço pela poesia. Era comerciante e fez a vida no bairro do Baruel, onde os negócios da família prosperaram. Em vez de usar sua influência e poder aquisitivo para comprar pessoas, coagir, ameaçar, sugar e concentrar poder, seu sentimento mais puro e genuíno devolveu a Suzano um dos locais mais sagrados de sua história.
O conto de fadas vivido por Carmélia e Abdo Rachid é outra demonstração de como o encontro de duas almas para uma missão compartilhada pode levar luz e esperança a todo mundo. Primeiro prefeito de Suzano, Abdo já era um homem influente quando se encantou perdidamente com as notas dedilhadas ao piano por Carmélia, uma órfã que nunca havia vivido fora dos muros de um orfanato. Em vez de ceder aos caprichos do ego, principalmente no que se refere a posse e status, Carmélia renunciou a todo conforto que teria quando contraiu núpcias com Abdo e, numa demonstração de missão como manifestação do amor universal, fez com que Abdo morasse com ela por um período no abrigo de menores.
Que em vez de escândalos, baixarias, corrupção e hostilidades que têm alimentado as ilusões externas de todos aqueles que, nas distrações do mundo material se deslumbram e vislumbram com o poder, possamos escrever outra página em nossa história conduzindo-a a uma nova poética na gestão de nosso país, estados e municípios.