Publicidade
27/03/2025
ÚLTIMAS NOTÍCIAS
O curso acontece entre os dias 31 de março e 2 de abril
Prefeito de Belo Horizonte, Fuad Norman teve uma parada cardiorrespiratória

Empossada, delegada da DDM de Ferraz defende conscientização para salvar vidas

Confira a entrevista exclusiva com a nova delegada da mulher de Ferraz de Vasconcelos, dra. Tatiana Kajimura

Receba as novidades direto no seu smartphone!

Entre no nosso grupo do Whatsapp e fique sempre atualizado.

Neste mês de maio, a cidade de Ferraz de Vasconcelos recebeu, oficialmente, a nova titular da Delegacia da Mulher, antiga demanda da população. À GAZETA, a dra. Tatiana Kajimura Chinelati falou sobre a instalação da DDM de Ferraz e suas expectativas para o serviço.

Confira:

GAZETA: Qual foi o caminho que a senhora trilhou até chegar aqui? 

Dra. Tatiana Kajimura: Eu estudei na Universidade Presbiteriana Mackenzie, fiz alguns estágios em instituições privadas, percebi que não era a minha praia, não era o que eu queria. Estagiei em todas as áreas e, por fim, na polícia foi o local onde eu me identifiquei, onde eu ficaria mais próximo da população e percebi que, de fato, esse era o meu perfil mesmo. Ficar mais em contato com a população do que os demais órgãos que já chegam com a problemática já instaurada.

Eu sou de São Paulo, mas já fui para Santa Cruz das Palmeiras, depois fui para Itapecerica da Serra e, por fim, Suzano.  De Suzano eu fui convidada para fazer parte da titularidade da DDM aqui em Ferraz. Então, não sou de Ferraz, mas eu estou residindo em Suzano.

GR: Em todos esses lugares a senhora também trabalhou em delegacias da mulher?

TK: Então, nas cidades onde não havia uma DDM propriamente dita, a gente faz todo geral, né?! Crime é crime, então de forma geral a gente fazia tudo, inclusive DDM. Relacionado à violência doméstica, a gente sempre teve contato, não numa especializada como estou hoje, mas sempre tive um contato.

GR: Então, é uma experiência que a senhora vai adquirir justamente numa delegacia que não existia até então. Vai ser o crescimento das duas?

TK: Sim, sim. Na verdade, a gente está desenvolvendo tudo junto, né? O que eu trouxe de bagagem, de experiência nas demais delegacias que não eram especializadas, e hoje aplicar aqui somente o que for relacionado à DDM.

GR: O que a senhora acredita que significa passar a ter uma DDM na cidade de Ferraz de Vasconcelos?

TK: É completamente diferente, porque, veja bem, dentro desse assunto, DDM, existem outros fatores, existem várias outras disciplinas que a gente precisa ter como estrutura: assistência social; a parte de abrigo; a parte de MP [Ministério Público]; a parte de proteção à mulher; a parte do judiciário com as medidas protetivas; afastamento, não comunicação, porque, apesar de a pessoa não estar próxima, ela pode ainda assim ficar gerindo a vida da vítima de uma forma negativa.

Existe também a parte de saúde, que é relacionada à violência sexual propriamente dita, e às demais violências que ocorrem dentro de casa, que muitas vezes não tem testemunha, muitas vezes é a palavra da mulher, então a gente precisa ter o olhar clínico de alguém que já reconheça na mulher, ou psicologicamente, ou até corporalmente, essa situação de violência doméstica, que às vezes um olhar assim menos especializado não consegue perceber.

Como na escola. Às vezes a criança relata uma coisa e o professor não tem essa experiência, então ele não percebe que a criança está sendo violentada, que a criança está sendo psicologicamente abusada, e aquela assistente social já tem mais essa experiência para perceber, então a DDM vem justamente para isso, para tratar de forma especializada esses tipos de casos.

É multidisciplinar, como a gente diz. Não adianta que eu faça um boletim de ocorrência, até uma medida protetiva, se não tiver um respaldo do Estado de uma forma geral, ou seja, eu faço uma medida protetiva, ou a pessoa sai de casa, a mulher muitas vezes fica sem dinheiro para sua subsistência, então precisa haver uma política pública para que ela, nesse momento, possa se reerguer, entrar no mercado de trabalho. Muitas vezes a mulher não se vê em outra situação sem a dependência econômica do marido. Isso é muito importante e muito caótico em relação à DDM, né, é uma coisa bem preocupante.

GR: Nos últimos anos, e isso até falando de modo geral no Brasil, a gente vê a crescente de números de casos de violência doméstica, de estupros e de questões relacionadas à mulher. Isso se dá porque está acontecendo mais ou porque as mulheres estão falando mais sobre isso?

TK: É assim, é um contraposto. Conforme a mulher vai ficando mais independente, vai ficando dona de si, ela consegue se tornar independente, não só financeiramente, como de todos do entorno da vida dela, por exemplo, das informações relacionadas ao abuso.

A mulher hoje consegue sair mais de casa, ela consegue buscar, até mesmo dentro da internet, informações maiores que antes não eram possíveis. Sempre ocorreu? Sempre ocorreu. Mas muitas vezes a mulher era muito submissa, porque era a cultura, ainda é a cultura, né?! Majoritariamente a cultura é essa ainda, mas a mulher tem tomado esse domínio da própria vida, domínio do próprio destino, domínio do próprio caminho que ela quer seguir, e não depender do homem.

Então eu acredito que é assim, a mulher se torna independente e ao mesmo tempo o homem começa a se sentir um pouco acuado por essa mulher, ela é dona de si, e o homem culturalmente se sente dono da mulher, como se fosse objeto, como anteriormente. Nossos avós, nossos bisavôs. Então eles têm essa cultura, a mulher tem que ficar em casa, fazendo comida, e o marido manda.  E aí tem se mudando essa estrutura familiar.

GR: A senhora falou em atuação multidisciplinar, é assim que deve se dar o trabalho da DDM de Ferraz?

TK: Sim. Existem outras instituições, eu estive conversando com a promotora, inclusive o MP tem até um programa de conscientização do homem que é legal, porque a gente sempre pensa que a mulher tem que se conscientizar, mas o homem também tem que respeitar. Então eu preciso de toda essa rede de apoio, porque sozinha a gente não consegue.

Existe parceria com a prefeitura, ação social, a parte de assistência social, não ação social no sentido financeiro, mas psicológico também. Muitas vezes a mulher fica tão frágil que ela não é nem capaz de cuidar do próprio filho.

Só o MP, só a polícia, só o Poder Judiciário, não são capazes de tomar medidas sozinhos que sejam eficazes. Então, graças a Deus, a gente tem o apoio de todas as instituições, a gente tem sido muito bem recebido.

GR: Há dados que comprovam que, pelo menos em registros, os casos de estupro de vulnerável são maiores que qualquer outro. Por que isso acontece?

TK: Como tudo isso ocorre dentro da intimidade da família, é difícil a gente responder pontualmente porquê isso ocorre. Imagino eu que, quando é criança, a professora percebe, a professora tem obrigatoriedade de oficiar as autoridades, o tio percebe, o vizinho percebe, todos eles têm a obrigação de verificar, e ao verificar, de relatar.

Já a mulher não, a mulher tem vergonha. E muitas vezes a mulher acredita que o estupro dentro de casa é normal, que ela tem essa obrigação de sexo com o marido, que ela é objeto, talvez ela não pense como objeto, mas que ela tem que praticar o sexo. Então tem que haver essa conscientização, que o sexo dentro de casa, fora de casa, tem de ser sempre consentido, independentemente de ser marido ou não.

GR: A DDM de Ferraz ainda não tem a sede física pronta, tem alguma previsão de quando vai ficar? 

TK: Na verdade, fisicamente, nós estamos aqui [no 1º Distrito Policial de Ferraz de Vasconcelos], justamente para que haja a obra e que a gente não atrapalhe fisicamente lá. Acredito que por volta de setembro ou outubro, eu não tenho dados concretos, porque vai depender de toda a estrutura.

De toda forma, ela está aqui, a todo vapor. Todos os casos de violência já estão sendo encaminhados, todos estão sendo devidamente atendidos.  O que acontece é que não está sendo lá, mas está sendo aqui.  A mulher que vier vai ser atendida da mesma forma que será lá assim que estiver instalada.

GR: Em abril foi sancionada a lei Lei 14.541, que diz que as delegacias da mulher têm que atuar 24 horas. A DDM de Ferraz está sendo preparada para atuar nesse formato?

TK: Existe a lei, mas ela precisa se adequar à realidade. Inicialmente, nós não vamos trabalhar 24 horas, no entanto, existe o concurso em andamento, nós temos um orçamento para que esse concurso seja acelerado e que haja mais profissionais para que a gente possa ter estrutura para tanto. Por hora, essa DDM ainda funciona no horário de expediente.

De toda forma, havendo, por exemplo, uma situação de DDM, a pessoa é encaminhada à central, existe um registro e depois ela é encaminhada à DDM.  Ou seja, em momento algum ela está desamparada, seja de manhã, de madrugada, em momento nenhum ela está desamparada.

GR: A cidade de Ferraz tem uma prefeita mulher, inclusive a instalação da DDM foi uma bandeira defendida por ela. A senhora acha que o fato de ter uma mulher em cargo de liderança ajuda nessa mudança de mentalidade que falamos há pouco?

TK: Olha, eu posso dizer por mim, como mulher. Eu acredito que o atendimento na delegacia por mulher é diferenciado, e eu acredito que pela prefeita também. Não entrei nessa seara com ela, mas ela está extremamente engajada com a DDM, ela está extremamente feliz. Você vê no engajamento, na preocupação dela, e isso eu falo abertamente, porque realmente eu estive com ela e ela está fazendo o máximo pela cidade nesse sentido.

Muitas vezes não é que o homem não perceba, mas ele não vê que por trás disso existem outras questões. O homem não percebe que o dinheiro dele dentro de casa, saindo a mulher, faz falta. Ele acha que a mulher vai conseguir emprego a qualquer momento.  Ele não percebe a dificuldade que é para a mulher ter duas jornadas de trabalho. E a gente mulher sabe. Salvo raras exceções, a verdade é essa.

GR: Quais as expectativas da senhora para a atuação da DDM?

TK: Olha, a minha expectativa é que a gente tenha maior proteção à mulher, que a gente consiga conscientizar homens e mulheres. Que a gente consiga conscientizar e que a mulher se empodere, não no sentido de largar o homem, no sentido de se tornar independente.

A gente também pensa na união da família, mas que ela saiba que ela tem alguns direitos e eles devem ser preservados. Mesmo em prol de conservar a família, direitos não podem ser feridos e a mulher às vezes não sabe.  Isso é o bem-estar da população.

Para a gente não é tão proveitoso que ela saia de casa e vai sozinha, o homem fica sozinho, que amanhã ele vai pegar outra mulher e vai fazer exatamente a mesma coisa. Então é essa conscientização do valor da família.  E se não for da família, o valor dela em si, que ela pode continuar, que ela pode trabalhar, e que ela não precisa, não depende de homem.

Muitas vezes a dependência é psicológica, não financeira. Porque a gente não pode falar que violência doméstica só acontece na população carente. Muito pelo contrário, é que não é divulgado.

Compartilhe com Todos!
Facebook
WhatsApp

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *