O Hospital Dr. Arnaldo Pezzuti (antigo “Leprosário Santo Ângelo”), localizado no distrito de Jundiapeba, em Mogi das Cruzes, desempenhou um papel fundamental durante a epidemia de hanseníase que o Brasil enfrentou há quase 100 anos.
O local demorou 10 anos para ser construído e foi fundado em 1928, projetado por Ramos Azevedo, referência na arquitetura de São Paulo naquele período. Na época, acreditava-se que a doença era extremamente contagiosa, o que fazia com que as internações fossem compulsórias. O terreno possuía uma logística interessante, já que estava próximo à estação ferroviária de Jundiapeba, que beneficiaria na hora de trazer os pacientes da capital.
Dos anos 1930 a 1950, ainda não haviam medicamentos e tratamentos para estabilizar a doença, o que dificultava ainda mais a vida dos pacientes, que viam pouco os familiares ou até mesmo perdiam o contato, como foi o caso do seu Otacílio, de 71 anos, morador do hospital até hoje, e que foi internado um mês após o seu casamento. “Vim pra cá com 19 anos, e nunca mais vi minha esposa”, comentou.
Apenas depois dos anos 1960 um medicamento foi criado, é utilizado até os dias de hoje e permitiu as visitas dos familiares dentro do Hospital-Colônia. De acordo com seu Moacir, de 70 anos, que foi internado compulsoriamente em 1972, as visitas podiam acontecer, mas sem toque físico. “Tinha uma cerca em uma das entradas, aí o visitante chegava, mas não podia dar a mão, se não o guarda metia ‘porrete’”, explicou.
No auge da epidemia, o hospital chegou a receber de 2 mil a 3 mil pacientes, que eram tratados nos pavilhões e, posteriormente, com a flexibilização, puderam se instalar nas casas das colônias.
O Hospital-Colônia na época foi projetado para ser uma cidade, e possuía diversas formas de lazer, como cinema, quadra de futebol, biblioteca, salão de beleza, entre outras opções para oferecer aos pacientes o mínimo de conforto.
Para o diretor do Departamento de Patrimônio e Arquivo Histórico da Secretaria Municipal de Cultura, Glauco Ricciele, a situação podia até ser cruel, mas também necessária: “Hoje, olhando aquela situação, a gente vê que é ruim, até cruel. Mas no período era o que tinha de mais respeitoso de tratamento para as pessoas. Mesmo sendo compulsório. E foi uma forma também de conter a doença, que na época acreditava-se que era altamente contagiosa”, explicou.
ESTIGMA – Segundo os moradores que foram pacientes, quando os trens passavam em Jundiapeba, as pessoas fechavam a janela e tapavam o nariz com medo de ser contaminadas. “Era muito complicado, mas Deus abençoou e, de 1980 para cá, o preconceito foi se acabando”, concluiu Moacir.
Fotos: Bruno Arib